22 setembro 2010

A Praça


Vou contar uma pequenina história, aqui sentado num banco em frente ao prédio histórico da Universidade Federal do Paraná, esta uma noite até agradável para Curitiba, escrevo esse relato, ou seja lá o que for isso, à mão livre numa folha sulfite, assim como fazia quando comecei a escrever nas madrugadas ociosas de insônia sem internet de muitos anos atrás. Imagens de James M. Barie me vem à cabeça, o personagem de Johnny Depp no filme “Finding Neverland”, o dramaturgo que inventou Peter Pan, não que eu esteja a sua altura, mas no cinema era de seu costume escrever seus contos na praça, e tanto na película como aqui, crianças correm de um lado ao outro tornando o clima semelhante, a liberdade peterpaniana de simplesmente poder estar aqui com a caneta no papel já me cativa inspirando tranqüilidade. Resolvi sentar-me aqui nessa praça, pois nesse domingo tedioso, não há ninguém no ponto do meu ônibus aqui ao lado, e sinceramente, agora já nem me importo mais com sua provável demora.

Definitivamente existe beleza na sombra projetada da minha caneta, são as luzes amareladas dessas lâmpadas de vapor de sódio, dão um clima bucólico, ainda mais se notar o contexto que estou inserido entre prédios antigos. Aqui na Praça Santos Andrade ainda reside o espírito nostálgico curitibano clássico. Ah, sim, mas ali em cima, alem das copas das árvores estão os topos dos prédios com seus anúncios publicitários, e no mais alto, há um enorme relógio digital não me deixando esquecer de que estou numa capital, também ali ao lado esta a Rua XV com sinais de modernização com suas fortes luzes brancas, chega a ser um contraste, tudo em nome da segurança. Já o chafariz, esse não esta no centro da praça à toa, jorrando alto sua água, que com a iluminação fazem as gotas parecerem pequenos cristais voadores, e a sua volta crianças brincam enchendo o ar de risadas e gritos, e alem delas temos seus pais jogando cartas, alguns casais namorando, um grupo de adolescentes, poucos andarilhos solitários e um escritor.

Volto a olhar para cima, abro os braços se apoiando no encosto no banco e assim fico por um tempo, me sinto bem, olhando o topo da araucária que esta na minha frente e pensando sobre o agradável fim de semana que se findará. Derrepente, percebo certos sons que alteraram o éter do local, são murmúrios e conversas, aquele quase silêncio que só era interrompido pelos poucos carros, pelo choque d’água e pelas crianças brincando lentamente se torna numa verdadeira muvuca. Centenas de pessoas, grupos em filas saem do Teatro Guaíra, a pseudo-nata da sociedade invade a praça com seus saltos altos, cigarrilhas escuras e óculos de armação agressiva... Eles realmente adoram levar um estereótipo a sério, percebo em uns a hipócrita pose velada, já em vários outros sinto que são genuínos, foco minha atenção neles. Percebo certa euforia, não consigo ver daqui o cartaz da obra que foi exibida, mas pela felicidade que noto provavelmente foi satisfatória. E como sempre, tem aqueles com olhares perdidos, ainda processando a informação recebida e outros poucos que demonstram certo alivio por estarem aqui fora de novo.

São tantos os olhares que me fitam curiosamente que minha caneta esta quase voando de minha mão, alguns ate param de conversar ao se aproximar, mas não desvio o olhar da folha e os percebo só com minha visão periférica. Paro por um momento e os observo, também estou curioso, o que será que eles estão pensando de mim, alguns olhares estão me intrigando. Percebo que eles acham que sou um artista, um rapaz disse: “não, ele esta escrevendo”, entendo acharam que estava desenhando, hoje não. Uma garota perguntou à outra que estava com ela “será que ele esta chapado?”, a visão limitada dela me intrigou, é preciso estar drogado pra escrever a mão em publico, ou será que escrever por hobbie já virou algo alienígena entre os adolescentes. Enfim, dos vários pequenos comentários, só um realmente mexeu comigo, ele veio de uma senhora estilo Hebe Camargo com um pote de laquê no cabelo que meramente disse: “Olhe só!”, mas demonstrou agradável surpresa a me ver com papel e caneta, em troca lhe enviei um sorriso, e também ao seu suposto marido que me encarava com bons olhos, eles voltaram o meu comprimento e seguiram seu caminho. Senti-me tão bem em chamar a atenção desses dois, dos transeuntes ordinários eles foram os que se destacaram, assim como eu aqui nessa praça à esperar por meu ônibus, que pra me levar pra casa, finalmente chegou ao seu ponto final.

09:11pm
12 de setembro de 2010

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